sábado, 6 de fevereiro de 2016

Continentalidade

Na maior parte do tempo procuro olhar para a sua personalidade terra-firme
sua continentalidade
como algum tipo de cais, calmaria
para minha alma tempestuosa
para o meu coração em brasa
como um emplastro pras queimaduras que me causo
com a minha vitalidade quase destrutiva
com essa vontade de viver que é tão grande
que beira a neblina das alucinações
que beira o salto sobre o precipício
Na maior parte do tempo procuro olhar pra sua sensatez
pra sua sobriedade
como algum tipo de lastro
que me ajuda a manter a firmeza
quando tudo chove em mim
quando sou somente tempestade
e trovejo.
Algo que me segura, que impede que eu me lance inteira
que eu me afunde instantaneamente
e me aprofunde demasiadamente neste sentimento
um constante lembrete de que não devo me envolver tão rápido
de que o meu pavio não deve queimar tão de repente
de que preciso me preservar
de que preciso me manter sólida, independente de
tudo.
Tenho encarado assim, como um aprendizado
como um desafio e uma forma de estar de frente com o que é mais difícil
com o silêncio que jamais fez parte de mim
e jamais pude compreender.
Porque eu sou palavra, poesia, vida em movimento
eu sou dor, alegria e amor transbordando por todos os poros
eu sou a vontade que brota do útero
em flor e desejo.
Eu sou o batom escuro demais, o tênis sujo inusitado
os anéis enferrujados, o cabelo que de supetão se torna mais curto.
A sua solidez
eu gostaria que me fizesse menos fluida e mais concreta
para que eu sangrasse menos
para que eu pudesse erguer meus escudos
e pudesse descobrir alguma forma de viver o amor com tranquilidade
sem tanta urgência
sem precisar me consumir tanto, tudo, sempre tudo.
Na maior parte do tempo, procuro mergulhar na sua tranquilidade
na sua risada leve
no seu olhar que oferece um sorriso de ternura
e que, numa análise mais cautelosa
percebo que oferece também uma ruga de preocupação
(porque no seu mundo há sempre a vírgula da crueza da realidade
a vírgula que te coloca em contato com a terra).
Na maior parte do tempo, procuro aprender a me sustentar
observando as bases firmes da sua engenharia
sua lealdade, sua coragem
sua certeza de um caminho que nunca se desvia
sua persistência nos seus próprios rumos
os que você traçou no seu chão.
Há, no entanto
dias em que eu só queria que você pudesse aprender um pouco comigo também
a ser mais água, mais ar
a jogar tudo pro alto e inventar a liberdade
a usar a criatividade pra ir tão além dos padrões da vida rotineira
pra expandir os próprios horizontes
e encontrar o sabor da intensidade
ao enganar o dever
e cavar no tempo apertado
o tempo de viver.





Nenhum comentário:

Postar um comentário