domingo, 7 de dezembro de 2014

Oração pra te proteger

Quando fecho os olhos desejo que qualquer força criadora do universo
Guie seus passos
Que você siga firme e teimosa, como é
Que você mude o mundo
Que você sorria quando encontrar uma florzinha
Desavisada, crescendo no concreto
Que você sorria sem motivo
Que você sonhe
Sonhe construções
Do que há de mais humano
Que o seu sonho se faça concreto
Concreto sem reboco
Na igreja mais iluminada do mundo
Que o verdadeiro Deus
Que mora na igreja do Povo
Esteja com você
Que o seu São Jorge te ilumine sempre
Que o amor que te rodeia penetre seu coração
Como a lâmina mais confortante do mundo
E você saiba
Que todo esse amor vai te acompanhar
E te cuidar
Onde você for

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Meu povo

O povo tem rugas desacreditadas
Pernas pesadas
Lágrimas saturadas
Braços de toneladas
O povo de tudo desconfia
Cansou de levar chibatada
O povo passa apressado
O povo está sempre atrasado
O povo não tem tempo pra nada!
O povo precisa garantir o pão
Cortaram as asas do povo
E ele se acostumou com o grilhão
O povo entende que está errado
Mas o povo tem sono...
O povo está muito cansado.

Levanta, Povo!
É hora de caminhar
O dia já vai raiar
Está na hora de acordar!
Levante, Povo!
Que povo é pra brilhar
Levanta, Povo!
E vamos lutar!
Vamos gritar!
Vamos dançar!
Levante!
Meu povo...
É hora de fazer nosso povo
Voltar a sonhar.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Amor de quinta

O amor... A busca pela palavra no google, tenho certeza, trará resultados infinitos. Desde textos absolutamente originais até bichinhos com corações latejantes e palavras com glitter. De grandes clichês a grandes descobertas. O amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói e não se sente, é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer. 
Eu, particularmente, sempre detestei Camões. Algum professor de literatura já ousou canonizá-lo: "O maior poeta da história!", e eu ali, nos meus 15 anos, me perguntando o que haveria de tão maior naquele texto manjado. Continuo achando manjado, feio, exagerado, poesia de quinta. Mas em partes talvez eu entenda. Talvez agora eu entenda. Nessa noite chuvosa, um copo de café, o coração cheio, tão cheio que aperta, aperta muito forte. Desejando uma cerveja, não tem cerveja. Tem café, música latina, chuva e escuridão. Um ser solitário diante de uma tela, as palavras (old folks) fluem pela ferida aberta, mas não há solidão. Dói sem doer. Querendo e querendo negar. Um medo inexorável de perder, vontade irresistível de fugir. Porque de repente eu estou nua, exposta, aberta, entregue. Me sinto capaz de imensidões e ao mesmo tempo tão frágil e pequena. É êxtase e é tortura. Contentamento descontente.
Leve, como leve pluma, muito leve, leve pousa. Muito leve, leve pousa. Na simples e suave coisa, suave coisa nenhuma. Sombra, silêncio ou espuma, nuvem azul que arrefece. Simples e suave coisa, suave coisa nenhuma, que em mim amadurece.
Talvez seja necessária uma poesia de quinta. Mas não de quinta requintada, de quinta mesmo. Poesia de botequim, de bar de copo sujo, de calçada mijada, de viadutos pixados. A poesia dura das grandes metrópoles. A poesia doída da imundície. O gosto amargo da humilhação. Talvez seja preciso provar de todos os venenos para entender o amor. Provar e não morrer deles. Mas tê-los correndo nas veias. Ateando fogo a tudo que há dentro. Se apegar à breguice, aos exageros. Poesia de quinta florescendo nos peitos salgados de prostitutas. Poesia do hálito etílico, cachaça, álcool, cerveja, gasolina.
Find what you love and let it kill you.
O amor me virou do avesso. O amor não era nada do que eu esperava. O amor me liberta do relógio em tardes quentes atemporais, o amor me torna cativa de uma espera interminável. O amor faz de mim a menor e a maior das criaturas. A mais sortuda, a mais desprezível. Uma ganhadora da loteria e uma desgraçada, andarilha, mendigando. O amor me faz mendigar. O amor me faz dar tudo em dobro. O amor me floresce, o amor me murcha. O amor me sangra, o amor me costura. O amor me nega, o amor me suplica. Eu digo sim, eu digo não, eu fico confusa, eu mudo de ideia. O amor é real e duro de realidade. O amor queima, arde, acaricia. O amor é o amor. E só meu amor é meu amor. Amor é uma palavra que não sabe dizer. Nenhuma palavra sabe dizer. O amor não cabe em lugar algum.
A busca pela palavra no google, tenho certeza, trará resultados infinitos. Infinitas explicações se inventarão até o dia em que o Sol não mais possa nascer para olhos humanos. Mas o amor não estará em nenhuma delas. E cada amor será o único de sua espécie.



quinta-feira, 18 de setembro de 2014

A mística

A mística é tudo o que mantém acesa na gente
A luz da revolução.
A mística é o amor do dia-a-dia
É a estrela distante que guia
É fonte perene de inspiração
A mística pode ser um retrato, pode ser um abraço
Ou um gesto de gratidão
A mística pode ser uma flor, pode ser um poema
Ou os pés marchando no chão
A mística é repintar a realidade
É praticar a lealdade
É dizer a verdade
É a saudade que me invade
Quando minhas companheiras e meus companheiros
Estão distantes do toque da minha mão
Porque amo cada um deles
Porque amo o Projeto Popular
E o Projeto Popular são eles e toda essa união.
A mística é o que agora enche meus olhos de lágrimas
O que me faz levantar todas as manhãs
A mística me compele a lutar
Me ensina a compreender
A mística não nos deixa esquecer
Da nossa razão
A mística é a mágica
E o que cuida do coração
Quando se entende que gente é gente
E não máquina
Precisa de cuidado, carinho, compreensão
A mística é se ligar profundamente ao próximo
Amar e tocar o próximo
Quando se aproxima a solidão
A mística é o cimento
Feito de sentimento
Que não deixa cair a construção
A mística é a poesia
Que não deixa o espanto se esvair
A mística é a bússola
Quando eu não sei pra onde ir
A mística fez morada em mim
E fez meu mundo mais bonito
Fez do fazer da luta um fazer alegre
E de um amor infinito
A mística é acalento da dor
A mística é lar e cobertor
Com a mística o mundo volta a parecer encantado
E eu volto a ser criança
De mim a força brota, se renova
Porque a mística é quem está ao lado
Porque a mística é esperança.








sábado, 23 de agosto de 2014

Consulta Popular

Fiz uma revolução em mim
Mudei a perspectiva do olhar
Mudei de opinião

Insisti em caminhar
E encontrei a direção

Eu vi brotar em mim
Como flor, desabrochar
Sentido pros meus passos
Eu vi a força florescer nos braços
Eu senti o mundo
E me enchi da razão

E a Luta ganhou em mim
Cresceu em mim
Irradiou em mim
Como um sorriso

E de repente eu fui mais que uma só
Eu fui Pagu, eu fui Macabéa
Eu fui Sandino, eu fui Zapata
Eu fui Marighella

E foi então que o buraco da minha alma
Se preencheu
E o que estava obscurecido
Se iluminou
Essa luz me aqueceu e me tomou
Fez de cada gesto
Uma imensa declaração de amor

E as lágrimas chovem dos olhos
Como a firmeza que hoje chove dentro e fora de mim.

Porque agora eu sei.
Eu encontrei.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Amora

Da sensação da sua pele, do brilho dos seus olhos, não posso dizer muito sem cair num grande clichê.
Posso dizer, no entanto, da sua maneira de caminhar na ponta dos pés, entre cacos de vidro-sentimento, temendo se machucar.
Com muita cautela, centímetro por centímetro, você avança com delicadeza, ereta, firme. De repente você para, arregala os olhos, sua frio, fica apavorada. Por algum tempo você se torna a imagem do medo.
Mas então você descobre que tem sempre alguma coisa que te ajuda a continuar, existe sempre o contraponto que te devolve a coragem, você mesma, algum objetivo, alguém que você gosta.
Você volta pra você, você volta pra mim.
Você volta a caminhar como se tivesse roubado toda a beleza do mundo para si. Você volta a ser um céu estrelado, uma infinidade de pontos brilhantes e quentes, sobre o pano escuro da incompreensão.
Posso dizer da minha maneira de ferir premeditadamente os pés, pulando de corte em corte, dançando, desenhando novos poemas com as gotas do meu sangue espalhadas no chão.
Posso dizer da coragem e da estupidez de jamais me preservar.
Posso dizer do quanto é claro pra mim, dito, profundo, fincado, crucificado, agarrado, infiltrado esse gostar de você.
Eu descobri você e me perdi do tempo. Eu perdi a noção das horas. Descobri que o mesmo intervalo pode ser infinito ou infinitamente minúsculo e que isso está completamente condicionado às suas andanças pelo mundo, pelo seu mundo.
Minha flor de ir embora, existir longe de você é ser saudade.
E hoje roubei alguns minutos do dia atropelado pra mergulhar na saudade, na lembrança, no seu cheiro que, metafisicamente, passou a pairar sobre o meu universo.
Roubei alguns minutos do dia atropelado para trilhar o caminho que me leva ao mais fundo e seguro de mim, onde você está.
Consegui! Te inventei em palavra!

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Poeira

O sol foi embora e levou consigo minha calma
a noite trouxe a ausência
o silêncio da sombra solitária
os suspiros dos olhares perdidos na janela
do ônibus
a cabeça que pende como se nunca mais quisesse tirar
o olhar do chão.
meu sentimento vaga
por lembranças e saudades
desconcertada, me parto
me desfaço
caio em farelos
seca e friável
como um pedaço de carvão
vôo com o vento
debaixo de pés e sobre sobrancelhas
sou poeira e fuligem
pó de construção
entrando pela janela do seu quarto
me embaraçando nos fios finos do seu cabelo
pousando nos dedos longos da sua mão
você me inspira, me expira, me tosse, me espirra
eu me espalho em partículas
por toda e qualquer direção
sou agora parte desse universo
da janela, da estante, do colchão
sou poeira cósmica
flutuando na imensidão
alcanço infinitos e torno a me espatifar
me espalhar e me fundir
ao chão

de repente!

é só meu reflexo na janela
do ônibus
e o meu rosto é só mais um rosto
sem nome e sem expressão
suspirando o ar coletivo da agonia
compartilhando o dia-a-dia
da solidão

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Da menina das palavras para o menino do silêncio

Sou feita de palavras
ás vezes penso que se algum dia pudesse me despir
de tudo o que amo, de tudo que escolhi pra mim
de todos os caminhos, de todas as pessoas
se eu me descascasse e me revirasse
perdesse todas as minhas camadas
isso restaria.
As palavras...
elas são meu porto, meu alicerce
não sei compreender o mundo de outra maneira
acho difícil entender o que emudece
o que cala me machuca...

Eis, no entanto, que num dia qualquer
um dia como todos os outros dos tantos da minha caminhada
conheci dois olhos de menino
também procurando a sua estrada
por alguma razão o seu caminho cruzou o meu
e plantou no meu olhar um pouquinho do que é seu
de alguma maneira o meu horizonte se expandiu.
Eis que num dia qualquer
encontrei um menino e o seu silêncio
que, diferente de todos os outros
não me pareceu áspero ou rude
(talvez um pouco triste).
Eis que num dia qualquer
ele me mostrou que talvez seja possível dizer mais
com os olhos, com gestos
que com palavras.

Quem dera tudo tivesse
o aconchego do seu olhar
o carinho com que você olha
para cada pedacinho do mundo
que mereça a sua atenção.

Viver você me faz acreditar
um pouco mais
na mágica de existir.












quarta-feira, 9 de julho de 2014

No ônibus

Ás vezes eu vou andando para o ponto de ônibus xingando baixo e chutando pedrinhas, são os dias em que eu só queria chegar logo, pro dia acabar logo, pra tudo andar depressa, os dias em que viver não é nada além de uma obrigação.
Ás vezes eu vou andando para o ponto de ônibus observando que o céu está muito bonito, muito azul, sentindo o vento no cabelo recém-lavado, ouvindo uma música gostosa no fone de ouvido, e fico assim dentro de mim.
Mas ás vezes, ás vezes eu acho que a vida não tem que andar tão depressa e que tem tanta coisa fora pra olhar só pra dentro. Nesses dias andar de ônibus tem toda uma graça, e se torna um momento de vivenciar todos os sentidos e a imaginação, de se conectar aos existires de outras pessoas, se colocar em sintonia com outros olhares e outras maneiras de sentir.
No ônibus tem sempre os velhinhos que não querem se sentar, mesmo quando alguém cede o lugar. "Não, minha filha, fica aí, se a gente fica de moleza acaba ficando mais imprestável do que já tá".
Tem as criancinhas que gritam "MAMÃAAAE!" no meio de todo mundo, cantam musiquinhas de parabéns, da xuxa ou da galinha pintadinha, e as mães encabuladas ficam tentando segurar os bichinhos, que num segundo estão de pé no banco, no outro já estão no chão se esgueirando pela selva de pernas. Puxa uma saia dalí, uma calça daqui, olha aquela batata no chão, e quando a mãe vê já tá tudo na boca.
Por falar em batata, tem sempre as pessoas com as mãos engorduradas comendo batata frita e que quase fazem um beicinho quando percebem que o molhinho que vem junto acabou.
Tem sempre os meninos de boné de aba reta, ouvindo um funk sem fone de ouvido, o que arranca olhares recriminadores da senhoras distintíssimas logo ao lado, elas descem do ônibus cochichando "que coisa horrorosa...".
Tem sempre alguém de uniforme dormindo com a cabeça no vidro, e volta e meia a gente chega no ponto final e eles acordam assustados sem saber onde estão. E aí é mais uma volta antes da cama tão desejada.
Tem as mulheres grávidas com seus barrigões pontudos de nariz empinado para o mundo, tem gente que manca, tem gente que pisa forte, tem gente que quase cai quando o ônibus dá uma balançada.
Tem sempre as conversas no telefone tão peculiares, é o namorado da fulana que terminou com ela pra ficar com a outra, o ciclano que não faz o serviço direito, a patroa que não deixa chegar 5 minutos atrasada, a beltrana que (cê acredita, menina?) fala mal de todo mundo.
Tem o moço bonito de óculos diferentes, com o olhar perdido, ensimesmado, alguma tatuagem bonita no braço.
Tem a moça perfumada, com as unhas feitas e a blusa de renda, que oferece o seu lugar a todo velhinho que entra (e nenhum deles aceita).
Tem a mulher gordinha e risonha que, quando todo mundo tá esmagado na porta, dá uma risada gostosa e logo emenda "nossa senhora gente, tô suando mais que tampa de marmita".
Tem sempre as pessoas que fazem o sinal da cruz quando o ônibus passa na frente de uma igreja.
Tem o grupo de adolescentes que senta sempre junto nas cadeiras do fundo, e eles vão falando alto, alheios a todos os outros, contando do esporro do professor, das paixões, combinando como é que eles vão entrar em tal festinha, vendendo identidades falsas.
Tem os universitários com suas mochilas pesadas, muitas vezes vão sacolejando, se equilibrando pra se segurar com uma mão só, enquanto na outra vai o resumo pra prova que vai começar daí 15 minutos.
Tem gente que fica de cara feia o tempo todo, tem gente que fica só em si mesmo, tem gente que sai empurrando todo mundo quando o ônibus para, tem gente que pisa no pé, que enfia a mochila na sua cara.
Mas tem gente também que se oferece pra segurar a mochila, que sorri gratuitamente, que ri das situações desconfortáveis, que espera todo mundo descer pra subir, que puxa assunto sem precisar e vira amigo de infância, que sabe o nome dos motoristas e dos cobradores, e vai contando o maior caso até chegar no seu destino e partir pra labuta de todos os dias.
Eu gosto do ônibus porque tem gente de todo tipo, cada um com suas angústias, suas alegrias, suas histórias, seus pensamentos e sentimentos, seu cheiro, seu gosto, seu sotaque.
E aí eu desço no ponto pertinho da UFU, alegre por ter escolhido uma profissão que vai me permitir cuidar de gente, esses seres complexos e cheios de tudo. Me sinto feliz porque sei que um dia vou estar perguntando pro seu João se ele está tomando os remédios da hipertensão direitinho e medindo a cabeça dos bebezinhos pra saber se eles estão crescendo certinho. E enquanto isso vou ouvir o caso do feijão na panela, do programa do Hulk, da prova da faculdade, da tinta do cabelo, do término do namoro.
E aí eu desço, pensando no café que eu vou tomar dali a pouco pra dar uma acordada e que "um dia ainda vou escrever alguma coisa sobre isso..."











sábado, 5 de julho de 2014

Para sempre

Depois que você se foi
tudo ficou um pouco mais escuro
eu entendi que a morte
nos arranca abruptamente dos braços
que ficam para sempre vazios
muito antes dos pontos finais
(há tanto inconcluído dentro de mim)
eu entendi que para sempre
é tempo demais.

Mas ainda te vejo
nos meus sonhos
te abraço e te digo
do meu amor que, espero
alcance dimensões e eternidades
e da minha saudade
perpétua
desde o seu último dia
diariamente
até o fim dos meus.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Liberdade fantasma

Liberdade
das leis
dos reis
dos seios
dos freios
dos réus
dos céus
dos meus
dos seus
dos medos
segredos
líquidos
fluidos
do perigo
do abrigo
do umbigo

Quero ser livre
do relógio, do moralismo, do comodismo
de todo gosto ruim
quero ser livre mas não consigo
porque a liberdade que eu preciso
é ser livre de mim.







segunda-feira, 26 de maio de 2014

Congelador

lutei tanto
quis tanto
proteger
aquecer
a que ser
vir
ia?
a que serviria?
a quem?
pra quê?
tudo que herdei de você
me fez
mais fria
vazia
sozinha
esse amor
congelador
não preencheu sua solidão.

nem a minha.




sábado, 24 de maio de 2014

Não há palavras
não há braços
não há consolo

Não há crença
de felicidade
nesse futuro tolo.


sexta-feira, 9 de maio de 2014

Desaparecer

Parem o mundo, que eu quero descer!
Revoguem as leis de Newton, contestem a relatividade de Einstein
Façam o tempo retroceder
Digam aos preceitos da medicina que o coração não mais pode bater
Neste acelerado compasso
Na mente suspira um imenso cansaço
Digam aos construtores do mundo
Que os braços querem pender
Balançar com o vento, soltos e livres
Dançar
Digam aos ponteiros do relógio que não quero padecer
Da doença do tempo
Não quero viver no esquadrinhamento das horas
Digam ao Sistema que sem a poesia prefiro morrer
E se o rio que move o moinho do mundo
Irá atropelar e afogar o meu tempo de florescer
De plantar e de colher
Irá proibir todo o prazer
E se esse rio irá esmagar
Comprimir meu peito contra as rochas
Desgastar todas as minhas partes para me moldar ao que devo ser
Digam ao rio que prefiro esquecer
Prefiro cair no profundo, escuro e morno esquecimento
Como num torpor que pouco a pouco chega para consumir
Tudo o que um dia eu sonhei ser
E se tudo for simples e somente um imenso devir
Digam a Heráclito que já não encontro o que me tire
Essa devastadora vontade de sumir.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Juventude que ousa lutar constrói o poder popular!

Por sermos jovens
Nossos olhos não perderam o encanto
Por sermos jovens
Qual força transformadora não haverá em nosso canto
Por sermos jovens
Sabemos que cada um de nós é um retalho
Um pedaço peculiar deste imenso manto
Manto que cobrirá o mundo
Este mundo tão ferido, torturado
Em nossos braços ninaremos o mundo
E plantaremos nesse chão nosso legado
Por amor a esta terra, por muito amor a esta gente
Lutaremos, jamais desistiremos
Pintaremos, enfim, um mundo diferente
Companheiros, companheiras, batalharemos tanto!
Seremos a flor que nasce do asfalto
Companheiras, companheiros, que este canto seja acalanto
E se faltarem forças, cantemos mais alto!
Por sermos jovens
Resistimos e resistiremos
Por sermos jovens
Por sermos jovens e sempre seremos!

domingo, 30 de março de 2014

Desamparo

caminha sob a noite
e quando quer parar
continua caminhando
hálito etílico
o coração dilacerado sangrando
como um coração hemofílico
caminha com seu passo torto
bastante rente à solidão
caminha como se já estivesse morto
despido, enfim, de toda ilusão.



segunda-feira, 3 de março de 2014

Amargurada

estrada
escura
escuta,
quanto tempo
a tristeza dura?
a ausência queima
teima
engole todo o meu ser
no espelho minha cara
descarada
cai desmascarada
como fruta demasiadamente
madura
foi tão doce
que agora é
amargura
armadura
árdua
estrada
de te esquecer


sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Gabriel

Quando você chega
sinto ter encontrado uma parte do meu lugar no mundo
meu coração se acalma
tudo fica mais fácil e mais claro
porque você é luz
você é uma luz que brilha tão forte...

Você olha para o mundo com olhos de criança
você tem mãos curiosas que desvendam todas as coisas do universo
mexendo, juntando, desjuntando, construindo e destruindo
sua mãos, assim como seus olhos
são e estão encantadas.

Me admira a simplicidade das suas respostas
a naturalidade da sua sinceridade
sem vergonha e sem medo
a facilidade com que você diz eu te amo
simplesmente porque o amor existe em você.

E assim eu me sinto livre para amar você
com palavras que não são adequadas a outras pessoas e outros contextos
me sinto livre para amar você sem palavras
olhando e dizendo com os olhos
me sinto livre do tempo como medida do quanto é plausível gostar
me sinto livre da pertinência
me sinto sentindo e puramente sentindo o que sinto.

Sua companhia alegre é um tsuru pequenininho
batendo as asas
devolvendo a mágica das coisas
me resgatando de mim mesma
da desesperança que me invade.





sábado, 15 de fevereiro de 2014

Quem sabe amanhã

A dor é o meu laboratório
de Billie Holiday a Nirvana já tentei de tudo
não vai passar
ela, a tristeza, está pregada em mim
e enquanto as guitarras dos meus ídolos esperneiam
e enquanto as palavras dos meus poetas ressoam,
sinto uma fisgada dessa dor dizendo
"ei, não se esqueça de mim"
sinto-me viva
sinto-me plena de minhas confusões
inspirações
ilusões
convicções
intensidade
sinto-me viva e vivo inteiramente
em tudo que faço há o efêmero
não espero permanência.

Mas, ao mesmo tempo
o amor eu gostaria que ficasse
até depois que a música parasse
até para lá da hora e do tempo
e ainda que começasse um outro dia
e a noite levasse toda a magia
consigo
eu queria que o amor ficasse
como hóspede descompromissado
folgado
que, entre xícaras de chá e café
se esquece de ir embora
olho para ele ali, bonito, um livro nas mãos
os óculos pendurados na ponta do nariz
distintíssimo
"amor, fique, por favor, fique"
ele sorri pra mim com olhos ternos e não responde.

Talvez seja hoje o dia
em que o amor e a dor vão me deixar
talvez hoje seja o dia
em que tudo vai mudar
o vento vai soprar diferente, o sol vai nascer do lado errado
o mundo vai acordar do avesso
o sentimento vai amanhecer virado.
Talvez hoje seja o dia.
Talvez amanhã...








sábado, 1 de fevereiro de 2014

O amor se morre

É assim que se morre um amor
quando toda dor
é maior
é assim que se morre o amor
nas palavras de Quintana ou de algum
trovador
é assim que se morre meu amor
no canto triste do condor
e assim todas as gerações de poetas do mundo
choram
e assim, doída a poesia se faz
cheia de cor
porque no fim cada poema é
só uma maneira de preencher o buraco
das durezas do mundo
das incompreensões
de todas as desilusões
que só se curam realmente
quando nasce
outro amor.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Ao ser humano mais livre

Dois pés bailarinos
Dançam por sonhos, tubarões e cortiços
Traçam caminhos
Como dádivas e condenações
Talvez a liberdade seja a nossa pena!
No lugar dos braços, duas asas

Apenas
Há penas
 

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Passageiro

Essa tristeza no olhar
meu bem
deixa o tempo levar
felicidade é onda do mar
que vai e vem

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Conchas

As pequenas conchas nada respondem sobre a imensidão do mar.
Observam inertes e inocentes, com olhos de quem nasceu na areia da praia e viveu sempre na calmaria de fim-de-onda que com um beijo displicente molha os pés.
Não, as pequenas conchas nada dizem sobre as grandes revoluções em alto mar, sobre a sua natureza feroz e inexorável, plenamente cheia de morte e de vida, de cadáveres e óvulos, de assustadores e consoladores braços.
As pequenas conchas mentem descaradamente sobre móveis, em quadros ou dentro de caixas, como delicadas memórias distorcidas.
Minúsculas conchas são como sorrisos partidos, fincados na areia das expressões costumeiras, após avassaladores tsunamis: o sentimento que irrompe em mim.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Poeminha bobo

Olha, meu bem
um passarinho cantando na janela
a noite caindo devagarinho
e se não der pra vida ser mais bela
te peço pra ficar mais um pouquinho

Olha, meu bem
tenho comigo palavras cheias de laços
e quando o tempo quiser fugir
embalamos ele nos braços
até fazê-lo dormir

Olha, meu bem
a vida se renovando no broto que flora
que nasce e que morre
assim como a tristeza que o tempo leva embora
enquanto o dia corre

Olha, meu bem
mais um poema bobo e torto
de alguém que também não sabe o que faz aqui
que ás vezes se sente um peso morto
mas que gosta um pouco mais da vida
se você sorri












quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Epifania

Ontem, no meio de sonhos delirantes
meio adormecidos, meio acordados
minha cabeça vagava por rostos de fantasmas
e eu me perguntava se afinal de contas o belíssimo ano novo
todo arrumadinho e vestido de branco
não estaria de fato amaldiçoado por essa noite insana
suspirando agonia
Ontem, olhando para cima
me vi de uma perspectiva diferente
tão pequena e maravilhada diante do privilégio de existir
ora, veja só, me dei conta de que boio despercebida no infinito
e não sou nada
que solidão consoladora a de me sentir humana
e nada, nem um fio de cabelo, nenhum desejo, nenhum equívoco
além dos próprios de minha humanidade
Ontem não acreditei no que vi nos olhos do amor
o senhor aí, amor, é, o senhor mesmo
não faça essa cara de desentendido
deixe cair sua máscara sublime
por um único momento, me olhe com sinceridade
e venha se arrastar no chão comigo
talvez quando e se o amor for
tão real quanto o barro sob os meus pés
talvez então eu o entenda
talvez então ele fale minha língua
e a aprisione em sua boca!
Ontem eu entendi que o silêncio é o refúgio maior
de quem, à trancos e barrancos, procura manter seus próprios cacos disjuntos
formando uma coisa só
como uma espécie de frankenstein
mas ainda assim, vivo.
Mantenha-se viva.
essa é a ordem
esse ainda é o maior pulsar em mim
o grito de minha espécie.
Ontem tive epifanias doloridas.
Hoje tenho a cabeça dolorida.
Talvez eu esteja lendo Bukowsky demais.